sábado, 3 de dezembro de 2011

Por que o desenvolvimento de Rosário do Sul importa.


Uma das mais belas passagens da filosofia sobre a indagação “Quem Sou?” mostra uma carruagem conduzida por dois imponentes cavalos sob o controle de um condutor em um campo imenso.


Os cavalos tem temperamentos diferentes: um quer manter-se na estrada, o outro quer invadir os campos; um quer seguir em frente, o outro deseja aventuras e prazeres.

O trabalho do condutor é controlar os animais e mantê-los na estrada. O desgarramento dos cavalos significa a impossibilidade de continuidade da viagem e o abandono. Sem eles, a carruagem não terá como prosseguir e o destino do condutor estará comprometido.

Esta metáfora não representa objetos desunidos, dispersos, mas a essência do ser humano, ou a alma (sem conotação religiosa).

A carruagem é o corpo físico.

Os cavalos são a razão e a emoção.

O condutor é a consciência, o “eu”.

A estrada é o percurso da existência.

O campo é o ambiente onde a pessoa se insere.

Quanto mais árido for o campo, quanto menores oportunidades de estabelecimento para o condutor, maior a distância da estrada a ser percorrida.

Trazendo para a realidade rosariense a metáfora, gostaria de encarná-la em duas pessoas distintas, uma do Plácido de Castro de 1970, e outra do presente, 2011. O motivo de escolha das duas pessoas é simples: de certo modo, as conheço. Poderiam ser quaisquers rosarienses e a ideia é, precisamente, que outras pessoas se identifiquem com elas.

A pessoa de 1970 se chama Telmo Lima e Silva. Cursou o antigo ginásio no Plácido e, ao iniciar o científico, Telmo foi estudar na Escola Técnica Federal de Pelotas.

Hoje mora em Portugal e é um bem sucedido especialista em ressonância magnética e tomografia computadorizada.

O ambiente representado por Rosário do Sul naqueles tempos era árido em termos de oportunidades de desenvolvimento profissional. A esmagadora maioria dos colegas de Telmo deixou a cidade. São condutores que tinham aspirações de vida definidas, perceberam as dificuldadse de realizá-las em sua cidade natal e conduziram seus cavalos na direção de locais mais propícias para realização dos sonhos e objetivos de vida.

Formatura do ginásio em 1970. Foto do álbum
 do Telmo, reproduzida com permissão.



                                                                                       
A pessoa do presente se chama Eduarda Silveira. Conheço-a virtualmente, mas uma frase colocada em seu Trabalho de Conclusão de Curso revela seu caráter batalhador e decidido:

 “Por mais longa que seja a caminhada, o mais importante é darmos o primeiro passo” (Vinícius de Morais).

De certo modo, essa era o sentimento que predominava na década de 70. Não significa necessariamente que Eduarda vá partir de Rosário, mas também não significa que desenvolva sua vida profissional na cidade. 

Aqui está a razão pela qual a cidade precisa reinventar-se, atingir novos patamares de desenvolvimento econômico e oferecer novas oportunidades para seus habitantes – impedir que talentos promissores a deixem, como aconteceu no passado e pode acontecer no presente.

Foto da Eduarda na rede social Facebook.
Reproduzida com permissão.


Uma cidade não pode ser conceituada apenas como local de morada. Deve reunir condições de permitir o pleno desenvolvimento das potencialidades humanas. Deve reunir condições da pessoa expressar suas habilidades criadores, transformadoras.

Uma das principais condições é a possibilidade da pessoa gerar renda, atingir um padrão de desenvolvimento econômico que permita atender o nível de vida que julga adequado para si e sua família. 

Mas renda não é gerada de forma isolada; exige cooperação e possibilidades de escolhas.

Uma pessoa quando adquire um bem ou serviço de outra, embora movida por interesses particulares, está incentivando aquele que lhe vende a manter seu negócio e mesmo expandi-lo na forma de nova opções de consumo.

Mas, para isso, é necessário que quem compra tenha a oportunidade de obter a renda que ora transforma em consumo.

A economia é um processo cooperativo e os administradores tem a obrigação de incentivá-la na forma de luta pelo desenvolvimento econômico expresso no florescimento de oportunidades. Mas parece que a administração de Rosário do Sul não percebe tais conceitos elementares. Não fosse assim, Rosário do Sul não teria perdido tanta gente desde a partida do Telmo, em 1970. São pessoas talentosas que poderiam cooperar com os que ficaram na geração de oportunidades econômicas em ritmo superior ao verificado (No recente censo do IBGE, Rosário do Sul se alinha com as cidades mais pobres do Rio Grande do Sul).

Não se está afirmando nem insinuando que as pessoas que permaneceram na cidade não sejam capazes ou competentes. Mas a força da cooperação foi enfraquecida. Cada vez que alguém parte de Rosário do Sul a procura de oportunidades em outros locais, a cidade perde duplamente: perde “cérebros” que estariam engajados no desenvolvimento da cidade e perde os investimentos efetuados em educação, pois os conhecimentos adquiridos serão aplicados em prol de outras comunidades.

Rosário não pode sequer aventar a perda da Eduarda como, no passado, perdeu o Telmo e grande número de seus colegas do Plácido de Castro.

Entretanto, a responsabilidade de incrementar o nível das oportunidades na cidade não é apenas da administração pública. A sociedade civil, tem uma responsabilidade gigantesca: precisa identificar, tornar públicos e buscar soluções para os problemas que inibem o desenvolvimento da cidade. 

Cito nominalmente aqueles que conheço: Gazeta de Rosário do Sul, as comunidades virtuais Rosário do Sul e Rosário do Sul / Debates, os advogados Jair Rodrigues Mendes e Luciana Flores Figueredo (por estarem envolvidos em causas comunitárias), o radialista Pedro Borges, a Rádio Marajá: todos precisam assumir a responsabilidade, além do que já o fazem, de se engajarem no incremento do bem estar e desenvolvimento econômico de Rosário do Sul. 

Cidades são organismos vivos. 

Basear-se na ilusão de que apenas as belezas das Areias Brancas impulsionarão o desenvolvimento da cidade é priorizar a emoção sobre a razão. Prestem atenção no fluxo de esgoto que deságua no Rio. Mirem no exemplo do estuário do Guaíba em Porto Alegre e dos problemas ambientais hoje enfrentados. Lembrem da partida da Cia Swift e do abandono da linha férrea.

Assumam conscientemente as rédeas do desenvolvimento econômico e social da cidade, sob pena de, não o fazendo, continuarem presenciando a perda do maior capital de qualquer sociedade: o capital humano.


Plácido de Castro em 1970 - Foto do álbum do Telmo.

Um comentário:

  1. Caro Ovídio.
    Quase que diariamente faço pesquisa no Twitter de temas ligados aos municípios da região, já que resido em Cacequi. Nesta manhã pesquisando por Rosário do Sul cheguei a seu blog e a este post.
    Não me atreveria fazer qualquer comentário sobre o que está dito acima. Apenas me arrisco a dizer que tudo se encaixa perfeitamente à realidade de vários municípios da fronteira oeste do Rio Grande, especialmente ao município de Cacequi, distante de Rosário cerca de cinquenta quilômetros.
    Aqui vivemos de propaganda, nossos administradores há muito tempo tem o mesmo discurso que ressalta algumas situações que mexem com a autoestima dos cacequienses como é o caso do município ter sido um dos maiores centro ferroviários do estado, possuir a maior ponte ferroviária da America Latina, ter sido Capital da Melancia e ainda não ter perdido a título de Capital da Trova Gaúcha. Entretanto na década de 80 éramos cerca de 20 Mil cacequienses morando por aqui, hoje somos pouco mais de 12 mil. Todos os anos famílias inteiras migram para grandes centros em busca de trabalho e renda. Ultimamente surge um novo destino, a África, para onde vários cacequienses já foram trabalhar na agricultura, deixando para trás um município essencialmente agrícola invadido pelas florestas destinadas a celulose.
    Hoje tenho uma certeza, ratificada por seu artigo, que se esta realidade não mudar, por aqui em breve teremos um enorme deserto e uma cidade fantasma.
    Eugenio Alves

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